Sentimento carnavalesco



É ter por dentro ecos formidáveis, batucadas existenciais,
passistas encantadas realizando a coreografia da saudade.




Ao lado delas, segue um jovem emocionado por viver
e saber-se carioca em profundidade,
identificado com tudo aquilo.
Aquele jovem saiu no bloco da vida e foi para onde?



É não se agradar do Carnaval concreto, que tem tudo "demais":
Preços, "seguranças", angústia, crachás, barraquinhas, nudez.

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É agradar-se do desejo de ser leve e solto,
vagabundo e belo,
e sem tantos deveres ou consciência;
é preferir a alma da festa que o seu corpo,
embora estupefacto
diante da beleza de mulheres impossíveis.



De escritor que se compraz no que não tem,
por dificuldade de se relacionar com o possível.


É a criação de um território próprio onde se é rei
pelo cansaço de ser plebeu no território concreto dos homens.



É ainda a ânsia de sair por aí,
sem intenções ou objetivos,
cansado de conhecer, analisar.
Querendo apenas ser e viver.
Sem cogitar.
É não se aproveitar da fantasia para dizer verdades
recalcadas e provocar ofensores.



É sair por aí numa boa e com uma só disposição>
a de não ter nada a fazer,
ninguém a quem convencer ou dar satisfações
a alegria liberta de dispor do próprio tempo
e da própria vontade
segundo o que vai acontecendo
e não segundo os planos tensos e contraídos
do "ter que fazer", "dizer", "compreender" ou "realizar".


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É a capacidade de ser criança, mulher ou grego.
Adoro fantasias de grego.
Sentir-me Pátroclo, o herói,
filho de Hércules,
amigo de Aquiles
e paquera de Helena,
indo para a Guerra de Tróia.



É ânsia de vôos e alegria.
Necessidade de não cogitar e
mergulhar na vida.


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Um instante de inconseqüência
no meio da trajetória idiotamente lúcida, tão obscura.



É mandar às favas a ânsia de metafísica,
mera expressão dos medos que moram na mente,
vizinhos dos pensamentos
(não se dão, esses vizinhos!).


É acordar tranqüilo e emocionado, certeza de festa.
Só esperança, só juventude.
Do lado de lá, tanto coração!
Do lado de cá, tanta vontade!
Apenas ser vítima da alma diabólica das festas,
jamais autor ou relator, organizador ou apreciador.


Entrega total, bobalhona, nenhum pudor.


Vontade de ser passista ou tocador de surdo,
de mergulhar no delírio,
ser mais um,
chutar seriedades e convicções,
deveres e testemunhos.




Texto de Artur da Távola. Recebi de "Lídia Eugénia".




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Última alteração: 22 fev 2009